sábado, 3 de fevereiro de 2018

Escravidão: quem foi vítima e quem foi opressor?

Entre 1550 e 1890, 12 milhões de negros africanos foram capturados por seus compatriotas poderosos que, movidos pela ambição de poder e riqueza, os venderam em troca de algodão e açúcar a comerciantes europeus. Estes, por sua vez, como negociantes que eram, os revendiam como escravos para fazendeiros e cidadãos ricos na América, geralmente em troca de açúcar e algodão. Era o branco trocado pelo preto.

Foi a maior migração de humanos do Planeta e a mais dramática. Dos 12 milhões capturados na origem, 2 milhões morreram em trânsito, amontoados como mercadoria nos porões dos navios negreiros. 

Muito embora a expatriação forçada e a condição de escravo impusessem uma severa e indigna degradação a essas pessoas, eles suportavam essa vida porque, enquanto mãos de obra úteis, eles ainda eram valorizados como "bens de produção" e, por isso, eram alimentados e tinham onde morar ou, pelo menos, onde se abrigar.

Por mais paradoxal que possa parecer, o outro grande golpe que essas vítimas sofreram foi a abolição que, por uma imposição legal compulsória e mal planejada, colocou toda essa gente nas ruas, sem casa, sem trabalho e sem ter, sequer, o que comer ou onde pernoitar. 

Foi um verdadeiro caos, pois a Lei proibia a relação escravocrata, mas não previa, nem tampouco regulava qualquer outro tipo de vínculo entre ex escravos e seus senhorios, obrigando a uma ruptura brusca, que deixou milhões de negros desamparados pelo país afora, em situação de indigência! Foram anos, talvez décadas de muito sofrimento, até que todo esse contingente se arranjasse na sociedade! Segundo alguns autores, eles não se arranjaram ainda, até hoje!

E foi justamente após a abolição - e por causa dela - que apareceram as primeiras favelas e guetos, assim como as centenas de quilombos e agrupamentos de pessoas em situação de penúria espalhados pelo interior do Brasil, tal como Canudos, por exemplo. 

A tão desejada libertação trouxe, como consequência, um efeito perverso, que não tinha sido avaliado. Ou seja, a liberdade foi conquistada, mas os ex cativos, acostumados ao paternalismo há gerações, não tinham condições de arcar com a própria subsistência, manutenção e segurança e caíram num limbo existencial, sem nenhuma assistência, nem por parte do Estado, nem da Igreja ou qualquer outra instituição que assumisse esse pesado encargo. 

A rigor, como diz o Historiador Florestan Fernandes, "a abolição foi uma espoliação extrema e cruel". No entanto, o estado, por razões óbvias, admite que fez corretamente o que deveria ter sido feito, pois se tratava de uma justa reivindicação da categoria.   

Entretanto, a alegação de que a abolição decorreu de uma suposta "reivindicação" da população escrava, não passa de mais um grande engodo forjado pela nossa história tendenciosa. Na verdade, muito mais que o desejo de liberdade de alguns negros idealistas, a abolição era uma necessidade dos patrões, pois, na medida em que os seus negócios cresciam, tornava-se economicamente inviável manter o grande contingente de "trabalhadores" sob sua responsabilidade. Imaginem uma grande empresa com dois, três ou dez mil funcionários, se tivesse que manter em suas propriedades centenas ou milhares de crianças, doentes, idosos, mulheres parturientes, tendo que prover saúde, educação, casa, comida e roupa lavada para toda essa multidão! Era impraticável! 

Não só o custo de manutenção de todo esse contingente tornava-se impraticável, mas, sobretudo, o custo de reposição da força de trabalho: escravo morto ou doente significava altos investimentos em aquisição de outro - bem diferente de ir ao mercado recrutar um novo funcionário. A única solução foi "libertar" essa gente para que cada um fosse se virar com a sua própria subsistência e com seus próprios problemas domésticos e de saúde, educação, etc, de preferência loge do trabalho.      

Todavia, cabe registrar que a maior escravização da história da humanidade foi de negros escravizando negros compatriotas, para "uso" próprio. Entre os séculos XVI e XIX a Etiópia foi o único país africano a resistir à colonização europeia, assim como a não "exportar" seus próprios cidadãos como escravos. Em compensação, os seus governos tiranos garantia condições para que parte da população fosse segregada para ser usada como escravos pelos mais abastados, chegando a ter 10% da população escrava.
Marcio Almeida é Engenheiro Mecânico e Engenheiro Industrial, Administrador de Empresas, MBA em Gestão Governamental e Ciência Política, Especialista em Informática, Especialista em Direito Administrativo Disciplinar, ex Diretor de Auditoria Legislativa e ex Presidente de Processos Disciplinares na Administração Federal Brasileira, Diplomado da Escola Superior de Guerra, MM∴, Escritor, Músico Amador, Meio-Maratonista, pesquisador autodidata em Nutrologia e Nutrição Esportiva, História e Sociologia.

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