Ele era o irmão grande, forte e inteligente. Estivemos juntos desde a primeira infância na roça, campeando boi de carro nas madrugadas geladas, levando comida pros companheiros nas frentes de capina e bateção de pasto. Capinamos junto arrozal no chapadão de samambaia, montamos em bezerro arisco, treinando pra ser peão de rodeio. Pescamos lambari e bagre nos grotões do Barreiro e fizemos balanço de cipó, pra imitar o Tarzan.
Ele foi pra cidade estudar, mas dois anos depois eu fui também. No meu primeiro dia de aula, ele me levou à escola e lá tornou-se meu protetor. Ninguém me enfrentava porque a canhota do meu irmão no pé do ouvido era um perigo! Por isso eu nunca apanhei em briga de rua. Aliás, nem briguei, pois os adversários pensavam duas vezes.
Até a adolescência formávamos um trio inseparável: ele, o Tarcísio e eu. Amigos, confidentes e solidários em tudo, desde as primeiras aventuras, os primeiros namoros, as primeiras lições de violão, as serenatas, as primeiras pingas juntos, os festivais de música, as bandas de rock... Tudo era aventura, desafio e alegria!
Eu fui pra Belo Horizonte em 1972 e ele foi em 1973. Enfrentamos muita barra pesada e muita dificuldade juntos. Mas, também, tocamos muito violão e cantamos, rimos muito e aprendemos muito com a vida. Nas manhãs de domingo andávamos à toa pelo centro da cidade, sentávamos no meio fio pra rir da vida ou nos aventurávamos escalando a Serra do Curral pra ver Belo Horizonte de cima.
Eu me mudei pra Brasília em 1990 e ele foi em 1995. Portanto, nunca estivemos longe um do outro por muito tempo e ele sempre foi de dentro da minha casa, ansiosamente recebido a cada fim de semana ou a qualquer hora, com a sua alegria barulhenta.
Nossas sextas feiras eram sagradas. Bastava um telefonema no meio da tarde pra decidir: "onde vai ser hoje?" e, onde quer que fosse, no final da tarde estávamos juntos, jogando conversa fora, rindo muito e, como ele dizia: "rico, bonito e com a razão!..." 😀
Cerca de três semanas antes dele partir, eu cobrei cuidados com sua saúde. Fui com ele no Plano de Saúde Geap, do qual eu sou o titular, solicitar autorização para procedimentos especiais mas, quando perguntei pelos resultados, ele desdenhou - talvez escondesse alguma coisa. Eu insisti, dei bronca, talvez tenha sido até muito incisivo... Mas ele apenas olhou pra mim com aqueles olhos miúdos, sem falar nada. Depois mudou de assunto e saiu de perto com ar entristecido. Parece que ele estava "jogando a toalha" por motivos que só ele sabia. Dias depois, no fatídico dia 19 de Janeiro de 2005, durante uma reunião no Ministério do Planejamento, onde eu trabalhava, o telefonema de um amigo me tirou o chão e o rumo, com as palavras "tenha calma e vai lá! Não é nada bom"...
Contudo, ele deixou uma bela história, cuja maior parte coincide com a minha própria história. Me ensinou muito, inclusive a tocar e a cantar as primeiras músicas, como essa que fala tanto do romantismo que sempre o emocionou e que agora eu gravei em homenagem a ele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário